domingo, 28 de fevereiro de 2010

Barra do Una















sábado, 27 de fevereiro de 2010

terceiro trecho


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não estive sob o céu de santos;
não fumei em santos;
não fudi em santos;
comi a comida das pessoas de santos sob uma plataforma suspensa:
uma média de café puro sem açúcar, um suco de laranja e um misto quente
minha garganta dói eu estou determinada a não adoecer
por uma hora ou menos estive a estar de pé dentro dos limites da cidade de santos
estou tentando arrastar meu coração comigo, mas ele mesmo ainda não pode estar de pé
estou rouca, minha voz está engrossando aos poucos
para que possa então falar com o timbre grave sobre as pessoas que deixei
como deixei santos:
com uma cólica que há quatro dias anuncia o estado do ventre mas não sangra nunca:
na próxima parada vou arrancar com a mão os espólios dos anos que passei sentada,
vou arrancar a sinusite, o veneno, a saudade, que se continuarem dentro hão de promover-me a menina de fados
não sei nada de santos, por bem ou por mal
tosse, cólica, aleluia estou indo embora mas já meu coração tampouco quedará
o ônibus no limite faz a curva
abre-se o mar

santos-peruíbe


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Saiu pela porta a grande promessa do cinema brasileiro (depois da Iracema de Bodanzky).

- Agora eu só pego este ônibus também, muito da hora ele.Ih, se eu pego o intermunicipal é só eu entrar prá todo mundo ficar me olhando com uma cara horrorosa, falando num sei o quê; sem contar que todo mundo sabe de onde eu tô vindo, prá onde eu vou, uma fofoca só. Mas este aqui é sussa.

Cutucaram-me; atenção, ela chegou!

- Patrícia, lembra não? Então, morreu. De leucemia, eu acho. E Letícia, menina, tá presa. Sim, ela era linda, linda, morena, tinha um cabelão, uma bunda incrível, uns coxões. Linda! Tá presa. Esse mundo da droga é uma loucura.

Subiu no ônibus e, em bom tom e com uma voz belíssima, fez questão de que todos escutassem sua história marginal.

- Ah, aqui é o ponto daquelas putas bandidas que me queriam cobrar vinte reais prá ficar na rua delas. Que rua delas, eu hein! Eu disse "Querida, a rua é pública, viu?!"

No entanto, obtinha um único respaldo direto e complacente: o da amiga puta, ao lado.

- Outro dia tive que sair no braço com um; porque quis o dinheiro de volta. Por isso que eu cobro antecipado. Antigamente era uma luta só, os caras iam embora sem pagar... Agora é "se não gostou, sinto muito!" É, menina, homem nenhum presta não. Poquíssimos ligam de volta, muito raro mesmo! A maioria usa e descarta.

Mas o balneário também ouviu tudo; em silêncio, fingindo-se de tempo fechado que depois do meio-dia fica ensolarado, mas ouviu. Silêncio de estrada barulhenta. Não há nada a fazer senão escutá-los.

- E tem uns também que acham que a gente é atriz pornô, né?! Aí querem fazer cada coisa...

Assim ficou gravada.

- O quê? Nunca deu o cú? Menina... Olha, tem uns finos que quando vai, vai, e é um de-lí-rio! Mas quando é grande também... Jesus! Aí, dói! Dói mesmo! Cruzes! Mas a grande maioria ou quer que eu chupe ou quer que eu coma. Mas eu não gosto de comer não, sempre deixo ele escondido entre as pernas, sabe? Porque eu adoro me sentir feminina, que mexam comigo, quando me elogiam. Ih, aqueles pivetes do supermercado, sabe? Então, vivem mexendo comigo também. Eu fico só escutando, só rindo.

Esperamos muito pelo momento em que descaradamente viraríamos a câmera para ela, que, por fim, teria nosso respaldo sincero - não o cínico, nem o tímido. Quando alguém fala para um dispositivo sabe que se trata, no mínimo, de comunicação viral.

- É, Praia Grande é tenso à noite.Um monte de drogado... Uma vez levei um tiro de graça na bunda. Veio um gordo de moto, todo se tremendo, drogadão mesmo, mesmo, e perguntou quanto é que eu cobrava. Falei "trinta" e ele me apontou a arma falando prá eu passar tudo o que tinha prá ele. Aí eu falei "Olha, acabei de chegar aqui, não tenho nada não, meu filho! E, putz, você não vai atirar em mim, né?!" E o filho da puta atirou. Senti, assim, uma ardência muito forte e todo o peso do corpo em uma perna só. E eu vi tudo: juntou um monte de gente em volta de mim prá me socorrer, eu sangrando muito, me deu um sono, um sono e eu querendo dormir e todo mundo falando prá eu resistir e não fechar o olho porque senão eu podia morrer... Um monte de homem prá me botar naquela caminha de hospital, daí chegou uma enfermeira com uma agulha enorme, daí eu não vi mais nada. Só acordei quando tava tudo bem e aquele monte de cabo em mim. Tinha dormido por três dias.- Outro desceu da moto botou a arma na minha cabeça, abriu a braguilha e falou "chupa!" Eu chupei, né, fazer o quê?! Até podia ter ido à delegacia, tinha decorado a placa da moto dele, mas aí já tinha passado... E ele era bonitinho, um garoto. Não imaginava. Antigamente eu tinha medo de faca apontada prá mim, arma não. Hoje tenho medo dos dois.

Entrou enquanto o balneário santista era filmado.
A Trava do EMTU.

primeiro trecho


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